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Livros de Alice Bailey

OS TRABALHOS DE HÉRCULES


5º Trabalho

A Morte do Leão de Nemeia
(Leão, 22 de julho - 21 de agosto)

O Mito

O grande Ser Que Presidia estava sentado no interior da Câmara do Conselho do Senhor e lá discutia o plano de Deus para todos os filhos dos homens, que são os filhos de Deus. O Mestre permanecia à direita e ouvia-lhe as palavras. E Hércules descansava de seus trabalhos.

E o grande Ser Que Presidia, no interior da Câmara do Conselho do Senhor, observava o descanso do cansado guerreiro e observava seus pensamentos. Voltou-se então para o Mestre que permanecia ao alcance de sua mão, na Câmara do Conselho do Senhor e disse: “Aproxima-se agora o momento para um terrível trabalho. Este homem, que é um filho do homem e ainda assim, um filho de Deus, precisa estar preparado. Que ele verifique bem as armas que possui, que ele dê um polimento em seu escudo, e mergulhe suas lanças numa infusão letal, pois que terrível é o trabalho à sua espera. Que ele se prepare.

Mas Hércules, descansando de seus trabalhos, desconhecia a prova à sua espera. Ele sentia-se forte em sua coragem. Descansava de seus trabalhos, e inúmeras vezes passava pelo quarto Portão perseguindo o gamo sagrado até o templo do Senhor. Chegou um momento em que a tímida corça conheceu bem o caçador que o perseguia, e mansamente submeteu-se ao seu comando. Assim, muitas e muitas vezes, ele carregava o gamo junto ao coração e dirigia-se ao templo do Senhor. Assim descansava ele.

Lá estava Hércules diante do quinto grande Portão, armado até aos dentes com todos os troféus da guerra e de guerreiros, enquanto os deuses observavam-lhe os passos firmes, o olhar decidido, a mão firme. Porém, no âmago de seu coração havia dúvidas.

“Que estou fazendo aqui?” disse ele. “Qual é a prova, e por que razão procurei passar por este Portão?” e esperou esforçando-se por ouvir uma voz. “Que faço eu aqui, oh Mestre de minha vida, armado, como vedes, com completa panóplia de guerra? Que faço eu aqui?”

“Soou um chamado, oh Hércules, um chamado de profunda angústia. Teus ouvidos externos não responderam a esse chamado, e, contudo, o ouvido interno conhece bem a necessidade, pois ouviu uma voz, sim, muitas vezes, falando-te da necessidade e incitando-te a ousar mais. O povo de Nemeia procura tua ajuda. Eles estão sofrendo muito. Notícias de tuas proezas se espalharam. Eles te procuram para que mates o leão que devasta sua terra e vitima seus homens.”

“É dele este som selvagem que eu escuto? É o rugido de um leão atravessando o ar o que estou ouvindo? perguntou Hércules, e o Mestre disse: “Vai. Procura o leão que devasta as terras que se estendem para além do quinto Portão. O povo desta pobre terra vive silenciosamente a portas fechadas. Não ousam sair para suas tarefas; não cultivam a terra, não semeiam. De norte a sul, de leste a oeste ronda o leão, e nessa ronda furtiva apodera-se de todos que cruzam o seu caminho. Seu temível rugido é ouvido durante a noite e todos tremem por trás das portas trancadas. Que farás tu, oh Hércules? Que farás?”

E Hércules, o ouvido atento, respondeu à necessidade. Sobre o lado mais próximo do grande Portão que firmemente guardava a terra de Nemeia, ele depositou a panóplia de guerra, retendo para seu uso o tacape que cortara com suas próprias mãos de uma tenra e verdejante árvore.

“Que estás fazendo agora, oh, filho do homem, igualmente um filho de Deus? Onde estão tuas armas, onde estão tuas fortes defesas?” “Este belo conjunto de armas tornam-me pesado, retardam meus passos e dificultam minha partida no Caminho. Não precisarei de nada mais a não ser o meu forte tacape; e com ele e meu coração destemido, caminharei à procura do leão. Avisai ao povo de Nemeia que eu estou a Caminho, e dizei-lhes que expulsem de si o medo.”

De lugar a lugar andou Hércules à procura do leão. Encontrou os habitantes de Nemeia escondidos atrás de portas fechadas, à exceção de uns poucos que se aventuravam a sair premidos pela necessidade ou pelo desespero. Eles andavam pela estrada à luz do dia, ainda que cheios de temor. Aclamavam Hércules com júbilo, a princípio, depois, com dúvida, ao ver que ele viajava desarmado, com pouco conhecimento sobre os hábitos do leão, portando apenas um frágil tacape de madeira. “Onde estão tuas armas, oh, Hércules? Não tens medo? Por que procuras o leão desarmado? Vai procurar tuas armas e teu escudo. O leão é forte e feroz e já devorou muitos homens. Por que te arriscas? Vai procurar tuas armas e a panóplia da força.” Silenciosamente, sem dar resposta, o filho do homem que era o filho de Deus, prosseguia no Caminho, observando o rastro do leão e acompanhando o som de seu rugido.

“Onde está o leão?” perguntava Hércules. “Está aqui”, respondiam-lhe. “Não, está lá”, dizia outro. “De forma alguma”, dizia um terceiro, “ouvi-o urrar, selvagemente, na montanha esta semana.” “Eu também, mas aqui, no vale onde estamos”, acrescentava outro; e mais outro: “Eu vi seu rastro numa trilha por onde passei, por isso, Hércules, ouve minha voz e segue-o até a sua toca”.

E assim Hércules prosseguia em seu caminho, com medo, mas contudo, destemidamente; sozinho, contudo não solitário, pois pelo caminho havia outros que acompanhavam seus passos num mito de esperança e temor. Durante longos dias e noites ele vasculhou o Caminho, ouvido atento, procurando o rugir do leão enquanto o povo de Nemeia permanecia encolhido por trás de portas fechadas.

Repentinamente, ele viu o leão. Na extremidade de uma espessa moita, lá estava ele. Vendo que um inimigo se aproximava, e um inimigo que não demonstrava medo, o leão urrou e ao seu rugido as árvores tremeram, os habitantes de Nemeia fugiram e Hércules permaneceu imóvel. Ele agarrou seu arco e as flechas e com mão firme e olhar treinado mirou a espádua do leão. Disparou direto ao alvo. A flecha caiu ao chão sem perfurar a espádua do leão. Lançou flecha após flecha até não lhe restar nenhuma mais. Então, incólume, ileso, rugindo furiosa e destemidamente, o leão caminhou em sua direção. Lançando o arco ao chão, o filho do homem que é um filho de Deus, gritando loucamente, correu para o leão, que estacou, bloqueando o Caminho, estupefato diante de uma proeza que ele jamais vira, pois Hércules continuava avançando. De súbito, o leão deu meia volta e correu, à frente de Hércules, para uma moita nas rochosas escarpas do caminho na montanha. E assim os dois continuaram, até que subitamente, estando Hércules percorrendo o Caminho, o leão desapareceu e não mais foi visto ou ouvido.

Hércules estacou no Caminho, em silêncio. Vasculhou todos os lados, firme em sua mão o fiel tacape, o presente que dera a si mesmo em dia já bem distante. Procurou por todos os lados, de um ponto a outro do estreito caminho que cortava obliquamente a encosta da montanha.

De súbito, deparou com uma caverna de onde partiu um vigoroso rugido, um som trovejante, selvagem, que parecia preveni-lo que se entrasse, perderia a vida. Hércules gritou para o povo da terra: “Encontrei o leão. Aguardai o que farei”. E Hércules, que é um filho do homem, e contudo um filho de Deus, penetrou na escura caverna e saiu do outro lado, para a luz do dia, sem encontrar o leão, só aquela abertura. Ali parado ouviu o leão às suas costas, não à sua frente.

“Que farei?” pensou, “esta caverna tem duas entradas e enquanto eu entro por uma, o leão sai pela outra e entra por aquela por onde acabei de passar. Que farei? Não tenho armas: Como matar este leão para salvar o povo de suas garras? Que farei?”

Enquanto olhava ao redor procurando uma solução e ouvia o rugido do leão, viu algumas pilhas de toras e gravetos em profusão. Puxando-os para ele, arrastando-os com toda a sua força, bloqueou ambas as saídas, encerrando-se a si próprio e ao leão dentro da caverna.

Com as mãos nuas agarrou o leão, prendendo-o ao seu próprio corpo, apertando-lhe o pescoço. O hálito do leão queimava-lhe o rosto, mas sem afrouxar suas mãos, ele o mantinha preso. Os rugidos, um misto de ódio e terror, tornaram-se cada vez mais débeis; seu corpo amolecia e escorregava, mas Hércules não cedia. E assim, sem armas, com suas próprias mãos e sua própria imensa força, ele matou o leão.

Ele matou o leão, retirou-lhe a pele e mostrou-a ao povo do lado de fora da caverna. Gritaram eles: “O leão está morto! Está morto o leão! Podemos agora viver e arar nossas terras e plantar as necessárias sementes e caminhar juntos em paz. O leão está morto e grande é o nosso libertador, o filho do homem, que é um filho de Deus, que se chama Hércules”.

E assim, em triunfo, Hércules retornou ao Ser Que o enviara para provar sua força, para servir e ir de encontro às necessidades dos que estavam em profundo sofrimento. Ele depositou a pele do leão aos pés daquele que era o Mestre da sua vida, e teve permissão para usá-la em substituição à velha e gasta pele que usava.

“O feito foi cumprido. O povo está agora livre. Não há mais medo. O leão está morto. Com minhas próprias mãos eu o estrangulei e o matei.”

“Mais uma vez, oh, Hércules, mataste um leão. Mais uma vez o estrangulaste. O leão e as serpentes têm que ser mortos uma vez e mais uma vez. Bom trabalho, meu filho. Vai e descansa em paz entre aqueles que libertaste do medo. Terminado está o quinto trabalho e eu vou dizê-lo ao grande Ser Que Preside, aquele que se senta e espera na Câmara do Conselho do Senhor. Descansa em paz.”

E partindo da Câmara do Conselho soou uma voz: “Eu SEI” (O Tibetano)

O Número Cinco

No quinto signo, Leão, Hércules executa aquele que, de seus trabalhos, é historicamente o mais conhecido, pois a morte do leão de Nemeia sempre foi associada a Hércules, embora seja interessante notar que este famoso trabalho não tem relação alguma com a pele de leão que ele sempre usou. Esta era a pele do leão que ele matara antes de incumbir-se dos trabalhos e que fora o seu primeiro ato de serviço. Por aquele gesto ele demonstrara estar pronto para as provas e treinamento.

Numericamente, este é um dos mais interessantes trabalhos, e para bem compreendê-lo completamente e alcançar seu verdadeiro significado, precisamos examinar o número cinco que o distingue. Do ponto de vista do esoterista, cinco é o número do homem, porque o homem é um divino filho de Deus, mais o quaternário que consiste na sua natureza quádrupla inferior: o corpo mental, o corpo emocional, o corpo vital e o invólucro físico. Na linguagem dos psicólogos, o homem é um eu, uma continuação de estados mentais e emocionais, vitalidade, e o aparelho de resposta do corpo físico. Vimos estes quatro serem trazidos a um relacionamento com a alma envolvente, nos quatro signos precedentes.

Em Carneiro, a alma tomou para si o tipo de matéria que lhe permitiria entrar em relação com o mundo das ideias. Revestiu-se de um invólucro mental. Juntou à individualidade aquelas combinações de substância mental através das quais se pudesse melhor expressar. E o homem tornou-se uma alma pensante. Em Touro, fez contato com o mundo do desejo e seguiu-se um processo idêntico. Foram desenvolvidos os meios de contato sensível com o mundo do sentimento e da emoção, e o homem tornou-se uma alma que sente. Em Gêmeos, foi construído um novo corpo de energia vital através da reunião das energias da alma e da matéria, e o homem tornou-se uma alma vivente, pois os dois polos estavam em relação, nascendo assim o corpo vital, ou etérico. Em Caranguejo, que é o signo do nascimento físico e da identificação da unidade com a massa, o trabalho da encarnação foi completado e a natureza quádrupla manifestada. O homem tornou-se um agente vivo, no plano físico. Mas, é em Leão que o homem se toma o que em termos ocultistas se chama “a estrela de cinco pontas”, pois essa estrela é o símbolo da individualização, da sua humanidade, do ser humano que sabe que é um indivíduo e toma consciência de si mesmo como Eu. É neste signo que começamos a usar as palavras “eu” e “meu”.

A Sabedoria Eterna do oriente diz-nos que o número cinco é, entre todos os números, o mais oculto e o de mais profundo significado. Ela sustenta que o grupo de seres celestiais e espirituais que encarnaram na Terra manifestaram-se através do quaternário, e deste modo trouxeram à existência a família humana, formando o quinto grupo de vidas divinas e que, portanto, reuniam dentro de si mesmos os atributos duais do universo: o físico e o espiritual. Eles unificaram em si mesmos os dois polos. Eram, a um tempo, exotéricos e esotéricos; objetivos e subjetivos. Assim, temos o número dez, considerado o número da perfeição, da completação humana, o número do ser humano perfeito e completamente desenvolvido, que alcançou o equilíbrio entre espírito e matéria. Porém, é o número em que o espírito NÃO domina a matéria; é o número do aspirante cujo objetivo é subordinar a matéria ao espírito e, por conseguinte, desestabilizar o número dez.

As antigas escrituras orientais usam interessantes meios para expressar a natureza destes seres celestiais que são os homens da nossa época, nós mesmos, que somos os filhos de Deus encarnados. Chamam-nos os Senhores do Conhecimento e da Sabedoria, os Senhores da Vontade e do Sacrifício, os Senhores da Ilimitada Devoção - e estas designações, caracterizando a entidade espiritual que habita cada forma humana, merece a mais profunda consideração por parte daqueles que procuram trilhar a roda do zodíaco como indivíduos conscientes com uma meta espiritual. É por nossa própria vontade e com pleno conhecimento que estamos aqui. Com o propósito de elevar a matéria ao céu é que viemos à existência manifestada. Na sua essência e realidade, o homem não é o que parece ser. Ele é essencialmente o que ele demonstrará em Aquário, o signo oposto ao de Leão. Ele será, então, o homem com uma consciência universal em oposição à autoafirmativa individualidade típica de Leão. O indivíduo em Leão torna-se o iniciado em Capricórnio, e mostra-se como o homem completo em Aquário, o que se tornou possível devido unicamente à ilimitada devoção a um objetivo vagamente pressentido que o tem levado a percorrer vezes sem conta o zodíaco até conquistar a autoconsciência.

A propriedade e a relação do Quinto Mandamento com o quinto trabalho e o quinto signo tornam-se assim claras - “Honra teu pai e tua mãe para que teus dias se tornem longos na terra que o Senhor, teu Deus, te deu” - pois em Leão, Pai-Espírito e a Mãe-Matéria se unem no indivíduo e dessa união resulta aquela entidade consciente a que chamamos de alma ou o “Self’. Contudo, assim como este é o signo onde o homem se reconhece como o indivíduo e começa o ciclo de experiência no qual adquire conhecimento, este é também o signo no qual o homem autoconsciente começa seu treinamento para a iniciação. É neste signo que encontramos as últimas provas do caminho probatório. Quando o trabalho deste signo termina, começa o treinamento específico da iniciação, em Capricórnio. Uma certa medida de controle do pensamento foi conseguida em Carneiro, e um certo poder de transmutar o desejo foi alcançado em Touro. As maçãs da sabedoria foram colhidas em Gêmeos e a distinção entre sabedoria e conhecimento foi, até certo ponto, aprendida, enquanto a necessidade de transmutar instinto e intelecto em intuição e levar ambos para o Templo do Senhor foi compreendida em Caranguejo.

A História do Mito

Depois de um trabalho relativamente simples em Caranguejo, um trabalho bastante livre de riscos e perigos, Euristeu impõe a Hércules a tremenda tarefa de matar o leão de Nemeia, que devastava o país. For muito tempo o leão se mostrava uma força destrutiva contra a qual o povo se sentia impotente. Hércules achou que o único modo de atingir o seu objetivo era perseguir o leão por círculos cada vez mais fechados até que o tivesse encurralado numa caverna. Assim fez até que encontrou o rastro para o seu covil.

Vitorioso nesta etapa preliminar fez a desagradável descoberta de que a caverna tinha duas saídas e que enquanto ele entrava por uma atrás do leão, este desaparecia pela outra. Nada mais restava a fazer, portanto, a não ser interromper a peregrinação e bloquear uma das saídas da caverna, o que Hércules fez. A seguir forçou o leão a entrar pela agora única abertura, e deixando para trás todas as armas, incluindo a clava que ele próprio fizera, entrou na caverna e com as próprias mãos nuas estrangulou o leão, num encontro que ninguém presenciou; apenas Hércules e o leão na desolada escuridão da caverna, ambos empenhados numa luta que só poderia terminar na morte.

O Campo de Trabalho

O signo de Leão é um dos quatro braços da cruz fixa nos céus, a cruz na qual o Cristo Cósmico e o Cristo individual são sempre crucificados. Talvez a palavra “crucificado” adquirisse um significado verdadeiro, se a substituíssemos pela palavra “sacrificado”, uma vez que no desabrochar da consciência do Cristo na forma, etapa por etapa, vemos sendo sacrificados vários aspectos da natureza divina.

Em Touro, o símbolo da força criativa expressando-se através do desejo, vemos o aspecto inferior da força criativa divina, o desejo sexual, transmutado no aspecto superior ou sacrificado ao mesmo. Ele tinha que ser elevado ao céu.

Em Leão, vemos a mente cósmica expressando-se no indivíduo como a mente racional inferior, e este aspecto inferior igualmente tem que ser sacrificado e a pequena mente do homem deve ser subordinada à mente universal. Em Escorpião, que é o terceiro braço da cruz fixa, encontramos o amor cósmico ou atração cósmica. Aí ele se mostra seu aspecto inferior, e a isto chamamos a Grande Ilusão; e em Escorpião, vemos o aspirante na cruz, sacrificando a ilusão à realidade. Em Aquário, temos a luz da consciência universal irradiando o ser humano e produzindo o sacrifício da vida individual ao fundir-se com o todo universal. Esta é a verdadeira crucificação: o sacrifício do reflexo à realidade, do aspecto inferior ao superior, e da unidade individual à grande totalidade. Foram estas características que o Cristo tão maravilhosamente demonstrou. Ele mostrou-Se como o criador. Ele mostrou-Se atuando sob a influência da mente iluminada; personificou em Si mesmo o amor de Deus, e anunciou-Se como a Luz do Mundo. O problema diante de Hércules era, portanto, o problema do signo; a crucificação do eu inferior e a conquista da autoafirmação individual.

Originariamente, o zodíaco consistia em apenas dez constelações e, em data desconhecida, as constelações de Leão e Virgem formaram um único símbolo. Talvez o mistério da esfinge esteja relacionado a isto, pois nela encontramos o leão com uma cabeça de mulher, Leão e Virgem, o símbolo do leão ou realeza da alma, e sua relação com a matéria ou aspecto-Mãe. Pode, portanto, significar as duas polaridades, o masculino e o feminino, o positivo e o negativo.

Nesta constelação encontra-se uma estrela de brilho excepcional, uma das quatro estrelas reais dos céus. Chama-se Regulus, o Governante, o Dispensador da Lei, o que expressa a ideia de que o homem pode agora exercer a lei sobre si mesmo, pois que tem dentro de si mesmo aquilo que o torna o rei ou governante. Escondidas na constelação há também um vívido grupo de estrelas, “a foice”. Para os antigos iniciados, que consideravam todas as constelações exteriores como personificações de forças e como símbolos do desenrolar de um drama mais vasto do que até eles mesmos podiam compreender, a constelação transmitia três grandes pensamentos: primeiro, que o homem que era o governante, o rei, Deus encarnado, um filho de Deus; segundo, o homem era governado pela lei, a lei da natureza, a lei que ele fizera para si mesmo, e a lei espiritual à qual finalmente se subordinará; terceiro, que o trabalho de um indivíduo é usar a foice para eliminar tudo aquilo que impedir a aplicação da lei espiritual e, portanto, impede o desabrochar da alma.

Leão tem noventa e cinco estrelas, sendo duas de primeira grandeza. O nome egípcio significa, “jorro”, o Nilo dando sua máxima irrigação naquela estação do ano. Isto tem, também, um interessante significado esotérico, pois, de acordo com o ensinamento da Sabedoria Eterna, a família humana veio à existência através daquilo que é tecnicamente chamado “a terceira emanação” ou “terceira onda de Vida”, termo dado à entrada da primeira grande onda de almas em corpos animais, e portanto, a formação da família humana composta de unidades individuais. Outro termo técnico para esta terceira onda de Vida é “individualização”, tornando-se um indivíduo com autoconsciência, e assim ligando isto aos grandes acontecimentos no signo de Leão.

As noventa e cinco estrelas nesta constelação têm também um significado numérico: 9x10 + 5. Nove é o número da iniciação, dez é o número da perfeição humana, cinco é o número do homem; e assim, neste grupo de estrelas temos a história do homem, da personalidade, do iniciado e da sua conquista espiritual final.

As Três Constelações Simbólicas

Há uma imensa constelação chamada Hidra, a serpente, que está associada ao signo de Leão. Há também Crater, a taça, e Corvus, o corvo. As três sintetizam, em seu significado, o problema do homem que busca a iniciação. Mostram-lhe distinta e claramente o trabalho que ele tem a executar. À proporção que Leão, o rei, a alma, inicia seu trabalho, o homem descobre que ele tem que beber da taça do sofrimento e experiência, tem que vencer a serpente da ilusão, e a ave de rapina tem que eliminar Hidra, a serpente, nas gravuras antigas representada como serpente fêmea. Ela se estende por mais de cem graus, abaixo das três constelações: Caranguejo, Leão e Virgem.

Em escorpião, esta serpente da matéria ou da ilusão, com a qual a alma se identifica por tão longo tempo, é finalmente vencida. Hidra tem sessenta estrelas, e mais uma vez nos deparamos com um número significativo, pois seis é o número da mente, do trabalho criativo da Mente universal, e dos seis dias da criação. No sexto signo, Virgem, temos a forma completa. Está dito no Livro das Revelações que a marca da Besta é 666, e Hidra, a serpente, estende-se sob três constelações e o seu número 6 é, portanto, três vezes potente. Dez é o número da completação. Portanto, o seis expressa as limitações da natureza do corpo trabalhando através da forma e utilizando a personalidade; simboliza Deus na natureza, seja cósmica ou individualmente. Hidra, a serpente, representa o aspecto matéria, velando e escondendo a alma.

Crater, a taça, possui treze estrelas de média grandeza, e cerca de noventa pequenas estrelas, embora alguns livros de astronomia se refiram a três estrelas brilhantes e noventa pequenas estrelas. Novamente temos o número da matéria, ou da tomada de forma, e o número daquilo que é chamado “apostasia”, e “dar as costas” à alma ou aspecto Crístico, como fez Judas Iscariote. Esta taça realmente faz parte do corpo de Hidra, pois as estrelas na parte inferior da taça formam parte do corpo da Serpente e ambas as constelações as consideram suas. É a taça da qual todo o ser humano tem que beber, e que está cheia do que foi destilado da sua experiência na matéria. É a taça da obrigação em certos antigos rituais maçônicos, e simboliza o beber aquilo que nós mesmos preparamos. Em outras palavras, a mesma verdade está expressa na Bíblia cristã: “Tal como o homem semeia, assim colherá.”

Então temos em terceiro lugar Corvus, o corvo, que fica sobre a Hidra, a serpente, e a bica. Ela tem nove estrelas - outra vez o número da iniciação. O Velho Testamento começou com um corvo, o Novo Testamento começa com um pombo. A experiência começa com o pássaro da matéria e termina com o pássaro do espírito. É interessante registrar que em Aquário, o signo da consumação para Leão, encontramos Cygnus, o cisne, o símbolo do pássaro do espírito. Em A Voz do Silêncio, lemos: “E então não podes repousar entre as asas do grande pássaro. Sim, doce descansar entre as asas daquele que não é nascido, nem morre, mas é o Aum através de toda a eternidade.” E em um rodapé, H.P.B., referindo-se ao pássaro ou cisne, cita: “Diz o Rig-Veda... A sílaba A é considerada como sendo a asa direita do pássaro Hamsa, U a esquerda, e M sua cauda...” (Os Chakras, por C. W. Leadbeater)

No zodíaco de Dendera, Leão e as três constelações que a acompanham são descritas como formando um grande signo, pois o leão é visto pisando sobre a serpente. Corvus, o corvo, está pousado sobre o ombro do leão, enquanto que em baixo está uma figura feminina emplumada (novamente, o símbolo da matéria) sustentando duas taças, pois sempre há a taça que simboliza a taça da experiência, a taça da penalidade. A taça é a que é oferecida ao iniciado, à qual o Cristo se referiu no Horto de Gethsemane, quando ele pretendeu que a taça lhe fosse retirada, mas que ele acabou bebendo.

Assim Hércules, o aspirante, expressando-se em Leão, visualiza a grande batalha que o aguarda, sabe que seu passado deve influir para que seu futuro venha a ser cumprido, sabe que antes que ele possa subir a montanha em Capricórnio deve matar a Hidra e sabe que ele não pode mais ser o corvo, mas deve manifestar-se como a Áquila, a asa do Escorpião, e como o Cygnus, o cisne, em Aquário. Isto ele deve começar a fazer em Leão demonstrando o poder de ousar, enfrentando a terrível luta que o espera nos três signos seguintes e matando o leão de sua própria natureza (o rei dos animais) sozinho e sem ajuda, para assim ganhar o poder de sobrepujar a Hidra, em Escorpião.

A Lição do Trabalho

Dois pensamentos, colhidos na Bíblia, resumem a lição deste trabalho. Na Epístola de São Pedro encontramos estas palavras: “Seu adversário, o diabo, como um leão rugindo, se movimenta, procurando a quem possa devorar”, e em Revelações 5:5, encontramos as palavras, “Eis que o Leão da tribo de Judah, a Raiz de Davi, venceu para abrir o livro e os seus sete selos.”

Hércules, o aspirante, a alma, simbolizou o leão, o príncipe, o rei, o regente e por isso ele simbolicamente revestiu-se da pele do leão. O leão de Nemeia representa essencialmente a personalidade coordenada, dominante, pois o aspirante sempre tem de ser um indivíduo altamente desenvolvido.

Com os tríplices aspectos do eu pessoal inferior fundidos e, portanto, potentes além da média, o aspirante muitas vezes se torna uma pessoa até certo ponto cansativa e difícil. Ele tem uma mente e dela faz uso. Suas emoções são controladas ou, pelo menos estão a tal ponto fundidas com suas reações mentais que se apresentam excepcionalmente poderosas; daí ele ser excessivamente individual, muitas vezes bastante agressivo, autoconfiante e autossatisfeito, e sua personalidade ser, portanto, uma força devastadora no grupo familiar, na sociedade ou organização à qual possa estar ligado. Portanto, o aspirante, o leão de Judá, tem de matar o leão de sua personalidade. Tendo emergido da massa, e desenvolvido a individualidade, ele tem então de matar aquilo que ele criou; ele tem de tornar inútil aquilo que fora o grande agente protetor até o tempo atual. O egoísmo, o instinto de autoproteção, tem de dar lugar ao altruísmo, que é literalmente a subordinação do ego ao todo.

Por isso, o leão de Nemeia simboliza a poderosa personalidade, correndo de maneira selvagem e ameaçando a paz dos campos. Qual é a lição a ser aprendida pelo fato de Hércules haver cercado o leão em uma caverna que tinha duas aberturas? Por que ele fechou uma das saídas e entrou pela outra? E qual é o ensinamento espiritual subjazendo à tradição de que ali ele matou o leão com suas próprias mãos?

Muitas dessas velhas histórias conservaram a verdadeira interpretação do seu significado impenetrável por milhares de anos, e é somente nesta geração e nos dias atuais que o verdadeiro significado esotérico pode possivelmente emergir. O fato interessante sobre o período no qual agora vivemos é que ele assinala um desenvolvimento único na raça humana. Sempre houve manifestações dos deuses solares, e este trabalho de Hércules volta e meia foi representado por uns aqui, outros lá. Toda nação produziu aspirantes altamente desenvolvidos que seguem o rastro do leão da personalidade até a caverna e lá o dominam. Mas, relativamente, em relação com as miríades de unidades humanas, constituíram-se numa pequena minoria. Agora temos um mundo cheio de aspirantes; a próxima geração, em todas as nações, produzirá seus milhares de discípulos e já dezenas de milhares estão em busca do Caminho. As pessoas não são muito individuais, o mundo está cheio de personalidades e o tempo virá quando o leão da tribo de Judá prevalecerá sobre o leão do eu pessoal. Nós não estamos sozinhos nesta luta, como Hércules estava, mas formamos parte de um grande grupo de deuses-solares, que estamos lutando com as provas preparatórias da iniciação, e com os problemas que trarão à luz os plenos poderes da alma.

Em Capricórnio escalaremos o topo da montanha, e entrando agora, como estamos, no ciclo de Aquário, os aspirantes da humanidade estão na posição de começarem a lição do serviço e da consciência universal. Quando, no tempo dos anos 2000, começarmos a entrar em Capricórnio, haverá então, lá, uma imensa reunião de iniciados, e a escalada do monte da iniciação e do monte da transfiguração por muitas centenas de discípulos. Enquanto isso tem-se que lidar com o leão da personalidade e entrar na cova.

No simbolismo das escrituras mundiais, os acontecimentos mais importantes são representados em um de dois lugares: na caverna ou na montanha. O Cristo nasceu na caverna; a personalidade é dominada na caverna; a voz do Senhor é ouvida na caverna, a consciência do Cristo é nutrida na caverna do coração, mas depois das experiências da caverna é escalado o monte da transfiguração, o monte da crucificação é conquistado, para finalmente ser seguido pelo monte da ascensão.

Gostaria de dar aqui a interpretação técnica, talvez mais científica, desta caverna em que Hércules penetrou. A raça Ariana, à qual pertencemos, é de agudo desenvolvimento mental, e a consciência das pessoas em toda parte se está elevando rapidamente, partindo da natureza emocional, e assim do centro do plexo solar para o corpo mental e, daí, até a cabeça. Na cabeça há uma pequena cavidade, uma pequena estrutura óssea, que abriga e guarda uma das mais importantes glândulas do corpo, a hipófise. Quando esta glândula se acha em plena e apropriada atividade, temos uma personalidade ativa e equilibrada, integrada, ajustada, autocontrolada, com pronunciada atividade mental e persistência.

Esta hipófise é de configuração dual: em um de seus lobos, o frontal, se encontra a sede da mente racional, a intelectualidade; no outro, o posterior, se acha a sede da natureza emocional, imaginativa. Também se diz que esta glândula coordena todas as demais, controla o crescimento e é essencial à vida. E interessante que Berwan define a intelectualidade como a “capacidade da mente para controlar seu meio ambiente por conceitos e ideias abstratas”. Onde há falta de desenvolvimento desta glândula pode-se encontrar uma deficiência, tanto emocional como mental. Muitos endocrinologistas e psicólogos assim se têm posicionado. (*) É nessa caverna que o leão da personalidade desenvolvida ou individualidade tem sua toca e é aqui que o Deus-Sol, Hércules, tem de vencer.

Por muitos séculos os egípcios, e especialmente os indus, sabiam dos chakras, ou centros de força no corpo etérico. A descoberta do sistema endócrino mostra glândulas físicas correspondentes, nas mesmas localizações. Uma dessas, a hipófise, com seus dois lobos, simboliza a caverna com duas aberturas, uma das quais Hércules teve de fechar antes que pudesse controlar a personalidade pela mente superior. Pois só depois de haver bloqueado a abertura das emoções pessoais (o lobo posterior), depois de haver jogado fora até sua confiável clava, depois de haver simbolicamente recusado continuar a levar uma vida pessoal e egoísta, foi que, entrando pela abertura representada pelo lobo anterior ele pode subjugar o leão da personalidade na caverna. Essas correlações são tão exatas que apresentam, no pequeno e no grande, um tremendo testemunho da perfeita integridade do Plano. “Assim em cima como em baixo.” Uma surpreendente correlação entre as verdades biológicas e espirituais.

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(*) A alma e seu mecanismo, por A.A.Bailey.

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