O fim desde o princípio...

- "Demorou um tempo até eu perceber qual era a minha verdadeira missão”, disse-me um dia o Mestre. “As ilusões dos planos inferiores, muitas vezes, são bem reais. E leva-se muito tempo para se emergir das Trevas à Luz, do Irreal ao Real e da Morte à Imortalidade”, falou.

- “Mas, aos que tudo dão, tudo lhes será dado e apenas àqueles que não reservam nada para si e para o seu pequeno eu serão revelados os segredos maiores”, prosseguiu.

Apurando a audição, procurei chegar mais perto de onde estava o Instrutor, em uma rara preleção para um auditório lotado, onde não havia serviço de som. Na verdade, sequer energia elétrica havia naquele retiro, realizado em um mosteiro avançado, incrustado num elevado platô de imponentes montanhas, onde predominavam o silêncio, a reflexão e a interiorização. Um ambiente simples, desafiante e agradável, com alimentação vegetariana, onde estavam vedados os contatos com o mundo exterior, principalmente os dispersivos aparelhos celulares.

- “Por vezes, o momento de maior sofrimento é justamente aquele que nos traz para mais perto da verdadeira realização. Os usos da dor são muitos e a mesma é um instrumento que não pode, de modo algum, ser desprezado”, prosseguiu o Instrutor.

- “Remamos muitas vezes contra a maré, sem sair do lugar. Ventos traiçoeiros e nuvens carregadas ameaçam nossa frágil embarcação. Mas, sabemos que um mar calmo não faz um bom marinheiro, e mantendo uma vontade firme e uma atenção renovada aos comandos da Grande Hierarquia, é certo triunfar um dia e ver as todas dificuldades se dissolverem, revelando um novo e mais amplo panorama...”

- “Sim, porque a conquista de um cume apenas revela uma montanha ainda mais alta a ser escalada. Esta é a Lei em todos os planos. E, mesmo os Mestres que alcançam as realizações mais altas neste planeta, prosseguem para um serviço mais elevado em outros mundos. A menos que lhes esteja destinado, como missão, prosseguir a sua jornada nesta pequena e bela esfera azul onde habitamos, até que o último peregrino, cansado e exausto, alcance a outra margem”....

Enquanto o mestre falava, o céu permanecia azul nas montanhas, mas densas névoas encobriam os vales abaixo do mosteiro, protegido por um cinturão verde e amplas escarpas de pedra, onde devas e elementais criavam uma atmosfera protetora para aquele lugar mágico, isolado e propício ao silêncio, à comunhão espiritual e à meditação.

Os veículos motorizados – vans, ônibus e carros – chegavam apenas até determinado ponto, onde havia um amplo estacionamento calçado de pedras, limitado por uma alta escarpa de um lado e um profundo abismo do outro, de onde num dia claro se podia desfrutar da magnífica visão de um verdejante vale e das vilas próximas.

O resto do caminho até o mosteiro tinha que ser transposto a pé, por uma estreita trilha sinuosa de pedra em meio às montanhas, ladeada pela vegetação nativa, o perfume da mata e, aqui e ali, cantos de pássaros e o sonoro cântico dos riachos, cascatas e córregos que encantavam a todos com a música sonora de suas águas. Em determinados trechos, pontes e passarelas de madeira suspensas sobre o abismo cruzavam os pontos mais difíceis, tornando aquela travessia ainda mais prazeirosa e fascinante, embora desafiadora.

Toda essa caminhada, de algum modo, ia preparando o espírito dos viajantes e visitantes que, a cada passo, iam deixando para trás o stress e as preocupações da cidade e da sua vida pessoal e ingressando na atmosfera mais sutil e refinada do templo, onde os seus corpos etéricos – de forma lenta e quase que imperceptível - iam sendo submetidos ao processo de limpeza e purificação necessários para se adaptar às poderosas e elevadas emanações de Luz, Amor e Poder irradiadas do monastério, que fazia como que uma ponte entre a Hierarquia e a Humanidade.

Como já era de se imaginar, os que não estavam preparados, ficavam pelo caminho: tinham crises convulsivas, ou de choro, ou simplesmente não conseguiam mais prosseguir. A estes, era recomendado voltar, e um grupo de noviços do mosteiro e determinados carros estavam reservados para fazer a viagem de regresso até a aldeia mais próxima, sendo-lhes facultado voltar em outra oportunidade. Os que tinham a força e o chamado para continuar, contudo, eram brindados com grandes surpresas e preciosas revelações...

Sathyanaggar, Brasília - Março 2017

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