O Caminho Real

Caminho de Peregrinação de Ouro Preto a Diamantina
"A vida ou é uma audaciosa aventura, ou é nada." (Helen Keller)

Uma rota de magia, mistérios e de exuberante beleza natural no desenrolar do processo histórico de desbravamento e construção da cultura de parte da nossa história.


Ouro Preto

Na noite de São João de 1698 uma expedição de paulistas, à procura de ouro, acampou na margem de um córrego que cantava entre pedras. Chefiava esse grupo o bandeirante Antônio Dias, e vinha em sua companhia, como capelão, o Padre Faria. Ao acordar, na névoa da madrugada, os bandeirantes viram desenhar-se, pouco a pouco, o alvo tão procurado: o Pico do Itacolomi. A montanha pontuada, levando às costas o rochedo, vinha sendo mencionada há muito como o ponto de referência do local no qual um certo mulato encontrou, no fundo de um córrego, umas pedras negras que guardou e levou para Taubaté.

De lá o achado foi enviado ao Governador Artur de Sá Menezes, no Rio de Janeiro, e quando partido, verificou-se ser ouro puro, "que brilhava como a luz do sol". Há dois séculos os portugueses buscavam o ouro, finalmente encontrado, e em tal quantidade que "entre 1700 e 1770 a produção do Brasil foi praticamente igual a toda a produção de ouro do resto da América, verificada entre 1493 e 1850, e alcançou cerca de 50% do que o resto do mundo produziu nos séculos XVI, XVII e XVIII".

Exploração do ouro ocupa a cidade

O fluxo fabuloso do metal, carreado para a Metrópole, permitiu o fausto e o desperdício do rei D. João V (1689-1750), nas construções grandiosas do seu reino (o convento de Mafra, o aqueduto das Águas Livres em Lisboa, a capela de São João Batista, em São Roque), mas também o ouro dilapidado com a obtenção do título de "Fidelíssimo", para contrapor-se ao "Cristianismo" do rei da França, e as somas fabulosas absorvidas pela Igreja. Alexandre de Gusmão, Secretário de Estado dizia: "A fradaria mata-nos, a fradaria absorve-nos". O abandono do campo e das indústrias, pela corrida do ouro no Brasil, uniu-se ao tratado de comércio com a Inglaterra, assinado pelo ministro inglês Methuen, que abriu as portas de Portugal aos produtos da Inglaterra em troca de tratamento preferencial para o vinho do Porto. Ao final do século todo o ouro do Brasil foi absorvido pela Grã-Bretanha e ajudou a firmar o imperialismo e a prosperidade da era vitoriana.

As minas foram um fator de preparação para a Independência do Brasil. Pela sua interiorização os mineiros habituaram-se a resolver seus próprios problemas, habituados a contar pouco com o apoio da Metrópole, da qual recebiam apenas opressão, controle tirânico e ganância devoradora. Nos primeiros anos, o afluxo de garimpeiros não foi acompanhado por um desenvolvimento dos recursos necessários à implementação do novo núcleo urbano da Vila Rica de Ouro Preto, o primeiro povoamento ligado à mineração. Um período de extrema carência de alimentos trouxe miséria, fome, desordem, enquanto o Fisco estava interessado apenas no tesouro descoberto, criando as casas de fundição e descontando o Quinto Real. A subdivisão das terras em "datas", a multiplicação da escravaria, a exploração predatória acabariam por exaurir as minas e provocar conflitos e sedições. A disciplina e a lei não eram respeitadas pelos homens cegos de ambição e desprovidos de escrúpulos. A Guerra dos Emboabas, entre portugueses e "paulistas" , como se chamavam os brancos nascidos no Brasil e vindos de São Paulo, foi uma luta sangrenta que culminou com o incêndio e destruição do arraial dos Paulistas, no local de Ouro Preto hoje denominado Morro da Queimada. Outros levantes, como o de Felipe dos Santos, surgiram como protesto contra a opressão voraz do Fisco.

Riqueza que desenvolve o Brasil e o exterior

Em 1720, a Capitania de Minas Gerais foi criada e a busca do ouro começou a estender-se pela região próxima a Ouro Preto, Mariana, Sabará, Caeté, Catas Altas, Santa Bárbara, Morro Grande e mais a sudoeste de Ouro Preto, São João Del Rei e São José Del Rei (hoje Tiradentes). A exploração aurífera baseou-se principalmente na cata de areais no leito dos cursos d'água, e também na perfuração de túneis e galerias na perseguição de algum veio, por acaso encontrado. O ouro apresentava-se sob forma de folhetos, grãos ou pó, ou mesmo em forma de pepitas. Podia ser entregue às Casas de Fundição, as quais, após reservar o "quinto" do rei, fundiam o metal em barras, estampilhando-o com o selo oficial. A da Casa da Moeda datou de 1694, na Bahia, e passou a funcionar no Rio de Janeiro, de forma definitiva, no ano de 1702. Até 1808, entretanto, o ouro em pó circulava até mesmo em bilhetes de papel, emitidos pelo Governo.

A abertura do Caminho Novo para o Rio de Janeiro, mais acessível do que o de Salvador, acabaria por operar a transferência da capital de Salvador para o Rio, em 1763. Já a vila de Parati funcionou, desde o começo do século XVIII, como porto de saída do ouro. Esse ouro que correu em borbotões do alto sertão mineiro, chegou primeiro a Salvador, e logo ao Rio de Janeiro, partiu nos navios portugueses a abarrotar o tesouro real, logo esvaziado, como o tonel das Danaides, pela magnificência do Fidelíssimo. Quase se poderia dizer que D. João V encarnou o mito de Midas, que transformava em ouro tudo que tocava, com a diferença que a partir dos descobertos na área do Tijuco, o rei, enquanto tocava em ouro, começou a tocar também no fluxo dos diamantes. Mas pôde também degustar, com delícia, toda a doçura das missas e dos conventos de Portugal.

Na realidade, não foi apenas em Ouro Preto que surgiram da terra esses fabulosos tesouros. No Brasil apareceu ouro em toda parte. Beteou-se e encontrou-se o metal na Bahia, no Nordeste e no Sul, desde os primórdios. Embora em pequena quantidade, mas a partir do início do século XVIII Felisberto Caldeira Brant encontrou imensas jazidas em Goiás. Por todo o território mineiro, onde havia um rio, um riacho, um córrego, bateou-se ouro. Havia metal por toda parte.

Os rios de Minas entraram na História: o Rio das Velhas, o Rio das Mortes, o Ribeirão do Carmo, o Tripuí, o Paraopeba e outros cursos d'água inumeráveis acumularam durante milênios um incalculável tesouro, à espera do bandeirante ávido em busca do Eldorado.

Vila Rica, política e cultura

Entretanto, o que diferenciou Ouro Preto das demais cidades mineiras foi sua condição de sede do Governo Provincial, a implementação da Casa dos Contos, a maior Casa de Câmara e Cadeia da Colônia, a vida religiosa, e requinte de uma sociedade intelectualizada e brilhante, pelo culto das letras e das artes.

Foi a capital até o advento de Belo Horizonte, já na República, conseguindo permanecer ,até os nossos dias, quase intocada pela voracidade dos tempos atuais. É hoje um dos símbolos da nacionalidade, pois aí nasceram os primeiros impulsos da liberdade.(Fonte: Portal Ouro Preto)

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